Já faz algum tempo que a substituição periódica de smartphones, tablets, computadores e demais equipamentos eletrônicos indispensáveis no dia a dia – tanto de indivíduos quanto de corporações – deixou de ser um eletivo sonho de consumo para se transformar em realinhamento tecnológico inevitável. O fenômeno, inicialmente restrito a países desenvolvidos, se expande rapidamente a todos os quadrantes do planeta, impulsionado pela globalização, conduzido pelo giro cada vez mais célere da economia e, por fim, condicionado às estratégias de concorrência entre fabricantes. Como todos os processos artificiais, no entanto, o tão necessário upgrade também vem acompanhado de efeitos colaterais. Neste caso, as consequências se apresentam, literalmente, na forma de montanhas de lixo.
De acordo com estudo desenvolvido por meio de parceria entre a Universidade das Nações Unidas e a União Internacional de Telecomunicações, cerca de 52,2 milhões de toneladas de lixo eletrônico foram descartadas em todos os continentes apenas neste 2020. Comparações práticas ajudam a dar uma ideia da dimensão real desse descarte: devidamente organizados e acondicionados, os computadores, celulares, televisores e demais equipamentos eletrônicos desativados nos últimos 12 meses equivalem a 10 pirâmides de Quéops, a maior das milenares estruturas da Planície de Gizé, no Egito. O mesmo material seria suficiente para construir 5,5 mil torres Eiffel ou, ainda, para instalar duas passarelas ligando Nova York (EUA) a Bangkok, na Tailândia.
Não obstante as cifras relacionadas anteriormente sejam colossais, são as miudezas que se somam para compor os apetrechos tão triviais do nosso cotidiano que merecem toda a nossa apreensão. Notebooks e iPhones – com placas de circuito impresso, carregadores, baterias e acessórios -, por exemplo, reúnem quase todos os 118 elementos químicos da tabela periódica. Esse amálgama inclui desde ouro, prata, platina, cobre, alumínio e outros metais com alto valor de mercado, até produtos extremamente tóxicos, como antimônio, arsênio, berílio, bismuto, cadmio, chumbo e mercúrio, entre outros.
A lista ainda inclui as terras-raras – assim denominadas, por conta da extração extremamente difícil e cara -, como lantânio, térbio, neodímio, gadolínio e praseodímio. Isso sem falar nos vários tipos de plásticos e vidro.
Resumindo: um “simples” celular, do qual não nos separamos em nenhum momento, o notebook – instrumento de trabalho de milhões de pessoas nesses tempos de pandemia e home office -, ou a smart TV, que nos socorre como companhia/recreação durante o isolamento social, estão impregnadas de “riquezas” e, ao mesmo tempo, de substâncias que, se não descartas da maneira correta, representam, sim, risco em potencial.
A boa notícia é que, também nesta encruzilhada, o ser humano já se mostrou capaz de achar caminhos seguros. Numa clara demonstração de que os homens criam as ferramentas e as ferramentas realmente recriam os homens – como defendia o pensador das mídias Herbert Marshall McLuhan -, podemos lançar mão da logística reversa, da reciclagem e da metareciclagem como formas de reaproveitar com segurança os descartes eletrônicos – garantindo a sustentabilidade dos recursos naturais -, ao mesmo tempo em que evitamos riscos à saúde das pessoas e a degradação do meio ambiente.
Embora, evidentemente, ainda careçam de políticas públicas abrangentes, planejamentos macro e microrregionais, recursos e, principalmente, engajamento de muitos setores da sociedade, esses três métodos já são utilizados em nosso País. Em alguns setores – reciclagem de latinhas de alumínio e logística reversa de embalagens de agrotóxicos – o Brasil figura como referência mundial.
Em Sorocaba, a metareciclagem de equipamentos eletrônicos é uma experiência bem sucedida e merecedora de reprodução em larga escala. Iniciada há pouco mais de uma década, por incentivo da Secretaria Municipal de Desenvolvimento Econômico, Trabalho e Turismo (Sedettur), o modelo vem crescendo e evoluindo, alicerçada em consórcios com a iniciativa privada e movimentos cooperativos. O diferencial da metodologia é a extensão do conceito da reciclagem à tecnologia contida no objeto. Na prática, além da destinação ecologicamente correta dos materiais contidos nos equipamentos – principalmente nos computadores -, os procedimentos conferem sobrevida aos aparelhos, na medida em que os recupera e permite que continuem sendo utilizados quando isso é possível.
Neste exato momento, o programa sorocabano de metareciclagem passa por um oportuno processo de ampliação. Conforme divulgou o jornal Cruzeiro do Sul na edição de sexta-feira (11), a Sedettur está convidando a população, empresas, instituições e autoridades de toda a Região Metropolitana de Sorocaba (RMS) para conhecer e participar da iniciativa. A oportunidade é perfeita para todos aqueles que se preocupam com o meio ambiente e com a qualidade de vida da comunidade. O primeiro passo é acessar a reportagem disponibilizada pelo jornal em seu site (jornalcruzeiro.com.br/). Em seguida, mãos à obra.
https://www.jornalcruzeiro.com.br/opiniao/editorial/reciclar-e-preciso/